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174- Manejo sanfona

jyibyA7cqA beira do leito exige comunicação sobre o diagnóstico, 0 tratamento e o prognóstico.  A beira do leito exige tomadas de decisão sustentadas pela prudência. A beira do leito convive com resultados que foram ou não comunicados por ocasião da tomada de decisão. Nem sempre a abrangência e a profundidade da prudência são suficientes para evitar adversidades comunicadas ou não.

A beira do leito proporciona curva de aprendizado para um manejo sanfona da comunicação pelo médico. O grau de abertura vai sendo moldado pelas sequencias de individualidades presentes em cada momento. É a expertise do médico, é a reação do paciente, é a situação de infra-estrutura que habitualmente travam ou destravam a língua profissional.

Por mais que a conexão médico-paciente tenha se dado conceitualmente apropriada, ela conterá algum efeito sanfona- a maior ou a menor- com potencial de aflorar como “má-comunicação” perante o mau resultado e/ou a manifestação de efeito adverso. A questão clínica transmuta-se para questão ética e/ou legal. Pesadelos à vista.

Observa-se que a proporção atual do período de tempo empregado para as explicações sobre a tríade diagnóstico-tratamento-prognóstico é maior para as possibilidades do indesejável efeito negativo do que as do desejável efeito positivo. Sucede, então um manejo sanfona com o potencial de expandir as palavras sobre complicações e de encolher as sobre os objetivos primários dos cuidados com a saúde. Desfoques podem gerar apreensões, necessárias e desnecessárias, por isso, o valor da reflexão de cada médico sobre o modo de se comunicar.

Desde Hipócrates há a preocupação com o poder dos malefícios, que se acentuou exponencialmente com o progresso da Medicina. Persegue-se a perfeição profissional adjetivada no humano nível de boa- boas práticas-, afasta-se do erro profissional cuidando da Segurança e os habituais obstáculos no caminho são exigentes de manobras corretivas. Cada etapa envolve comunicação de apoio.

Mentalizar percalços faz o médico desejar conectar-se com o paciente  por meio de palavras que ajustem as suas expectativas pelo bom resultado ao mundo real das incertezas e das probabilidades. A verbalização expressa verdades do momento, certas ou prováveis, mas nunca certezas do amanhã. Acontece que a sociedade mostra-se cada vez mais exigente da perfeição, confiante na tecnologia como garantia de boa Medicina e desejosa de frases curtas e objetivas que se distanciem de idas-e-vindas de teses, antíteses e sínteses. Por isso, cada médico precisa construir seu modelo de conexão médico-paciente. Que dará comando ao manejo sanfona. Tarefa difícil.

Difícil porque tem sido progressivamente contaminada pelos problemas que desembocaram na Medicina Defensiva. Justificar o que não é – um diagnóstico diferencial-, justificar o que não deveria ter acontecido mas ocorreu- um efeito adverso-, justificar o que poderia ter sido a decisão, mas não foi- uma recomendação terapêutica- constituem projeções que motivam palavras antecipatórias, espalhadas em várias direções, ampliando o manejo sanfona. Elas representam “obrigação” para o processo do consentimento pelo paciente, é verdade, mas, o olho do médico está bem focado no “não foi deixado de ser avisado”. É isso mesmo, atenção ao entremeio de respostas clínicas e de respostas em  atitudes pelo paciente. Fundamento da Bioética da beira do leito.

Difícil porque cada paciente prefere um tipo de manejo sanfona pelo médico. E mais, mutável a cada circunstância. Entre os extremos do otimismo e do pessimismo radicais, há infinitas proporcionalidades, que como já comentado decorrem dos acasos de reunião de individualidades humanas, circunstâncias clínicas e estado de infra-estrutura. Fundamento da Bioética da beira do leito.

Difícil porque não se tem tempo, é o tempo que nos tem, nesta atualidade de sobrecarga profissional, que, desencadeia atitudes incompatíveis com o exercício da Medicina por vezes expressões de burnouts.  Reconhecer e praticar o quantum satis de manejo sanfona em cada caso exige desapego ao relógio. Carências de tempo comprometem a curva de aprendizado e o aperfeiçoamento do mesmo sobre a conexão médico-paciente. Direcionam para usos de “kit-informação” padronizado, que, como se sabe, atraem preenchimentos das lacunas de esclarecimento por analogia e por imaginação. Uma dupla terrível quando criadas pelas insatisfações com os resultados. Fundamento da Bioética da beira do leito.

É importante ter em mente o fenômeno sutil por parte de pacientes de qualificar uma palavra do médico, quer na anamnese, quer numa explicação, como agressão. O médico está bem intencionado, descontraído por entender que o paciente está protegido pelo sigilo profissional e entende necessária a revelação da informação. Não obstante, o paciente pode classificá-la como exageradamente invasiva, motivando no mínimo um cruzar os braços numa linguagem corporal de oposição, podendo chegar a uma manifestação verbalizada de contraposição que nubla o ambiente. Uso de drogas ilícitas, orientação sexual e tentativa de desconstrução de “maus” hábitos de vida- alimentar, fumo, sedentarismo-,  são exemplos corriqueiros do manejo sanfona  audível como sensação de agressão por parte do paciente. Potencial para efeitos explosivos adiante.

Por fim, a profusão de recados sobre males das tomadas de decisão, os muitos avisos necessários para o respeito a valores e a preferências do paciente e para os ajustes conciliadores, determinam a incorporação no manejo sanfona das entonações de voz e  da expressão corporal, expressões da racionalidade e da emoção na medida  conveniente para modular um bem-vindo toque de empatia.

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