Foi também nas primeiras décadas do século XX que o telefone fixo tornou-se instrumento de trabalho na área da saúde possibilitando a comunicação médico-paciente à distância. A conexão interpessoal saiu do espaço íntimo
de um exame físico ou do espaço pessoal da anamnese ou revelação de diagnóstico e conduta, para um espaço social que se alargou cada vez mais com a expansão da telefonia nacional e internacional.
Esta telecomunicação trouxe mais chance de o teor da conversa ser conhecido por terceiros não autorizados. Privilegiou-se o seu notório benefício e, pelo que se pode resgatar da História, ninguém mais vigilante da ética parece ter externado desassossegos restritivos em função da responsabilidade com o sigilo médico, mais especificamente com os efeitos da imprescindível voz alta para a comunicação à distância.
Porém, é ilustrativa a situação comum: a secretária passa a ligação para o médico no telefone fixo e o paciente em atendimento, na frente do médico, ouve tudo o que este está dizendo. Pronto! No mínimo, arriscou-se a quebra do sigilo, pois não houve expressa autorização da revelação a um terceiro, muito menos há enquadramento num dever legal ou numa justa causa – art. 73 do Código de Ética Médica vigente: É vedado ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.
A despreocupação enraizou-se em conversas nos elevadores, em ambientes sociais ou profissionais desligados do interesse de beneficiar o paciente. Neste contexto de revelação no decorrer da conversação, alguém pode radicalizar e até acrescentar que a conversa pode estar sujeita a um grampo telefônico, o que na prática parece que nunca foi considerado em apreciações sobre quebra do sigilo profissional. Na história da telefonia, recorde-se, houve época da necessidade de uma telefonista para completar a ligação, uma extensão de aparelho não era incomum, era levantar o fone do gancho e escutar a conversa, o aparelho era instalado num local de mais fácil acesso o que permitia à maioria das pessoas poder utilizá-lo. Chances de quebra do sigilo profissional não faltavam. Cada um se comportava à sua maneira quando desejava evitar testemunhas. Por tudo isso, pode-se afirmar que o uso do veterano telefone fixo para uma conversação entre médico e paciente, ou entre médicos sobre um paciente, assegurava rigidez com o sigilo profissional de inspiração hipocrática e formalmente exigido entre nós há cerca de 90 anos? A resposta é não!
Mas nunca foi alvo de pareceres e resoluções do Conselho Federal de Medicina. Estamos em novos tempos de conceito de cidadania e de meios tecnológicos para a conexão médico-paciente. Do cenário do telefone fixo onde não havia recomendações guardiãs do sigilo profissional, passamos, rapidamente, para o boom do aplicativo multiplataforma de mensagens instantâneas e chamadas de voz para smartphones, como o WhatsApp. Apreensão no meio médico: é ético usar como alternativa ao telefone fixo ou móvel?