Valendo-se da visão de responsabilidade profissional no contexto da iatrogenia, a evolução do prontuário em papel para o eletrônico trouxe mais segurança ao comprometimento com o sigilo, tanto na elaboração e manipulação necessárias, quanto na guarda pela instituição de saúde, enfim ao pertencimento ao paciente, que, a qualquer momento, tem direito a acesso e a cópia de inteiro teor.
Cabe, então, a questão: Por que não pretender o mesmo benefício com métodos eletrônicos de comunicação interpessoal e intergrupos com o aval da responsabilidade profissional? A medicina contemporânea é um carrossel.
Há complexidades e simplificações reativas se sucedendo e exigindo do médico novas competências. Assim é com a comunicação médico-paciente. Exige-se uma decodificação da complexidade pelo esclarecimento com respeito ao tradicional sigilo profissional.
Sobrevêm momentos para o médico se manifestar e momentos em que deve se calar. A Bioética contribui para o treinamento sobre para quem, onde, como, quando, e por que ter um ou outro comportamento profissional no que diz respeito às informações do paciente. Ela reforça o pensar e o repensar na esfera de proteção da intimidade de cada um, direito personalíssimo, que em face dos avanços tecnológicos, deve mais ainda considerar o custo-benefício.
Por séculos, a comunicação médico-paciente foi presencial e, assim, as quatro paredes do recinto da interlocução constituíam as fronteiras do sigilo profissional, cumplicidade para dentro, discrição para fora. A acepção do confessionário religioso predominava.
O século XX marca o deslanche de uma Medicina mais plural de impactos sobre a vida pessoal dos cidadãos, quer por diagnósticos, quer por tratamentos, quer por prevenções. A expansão dos exames complementares afastou ainda mais as quatro paredes tradicionais limitadoras do sigilo profissional. Novas disponibilidades tecnológicas ampliam diuturnamente o número de pessoas detentoras de informações sobre o paciente. A multiplicação de exames diferentes do praticado pelo sigiloso estetoscópio, se por um lado contribui sobremaneira para quebrar o sigilo das doenças, por outro, acentua as possibilidades de quebra do sigilo profissional.
Razão para o reforço da necessidade de manter viva a noção do sigilo profissional. No Brasil, a primeira orientação oficial sobre o sigilo profissional data de 1929, incluída no pioneiro Código de Moral Médica, na verdade importado da América latina. Ele continha um capítulo sobre o sigilo médico com dizeres como: o segredo médico é uma obrigação que depende da própria essência da profissão; há o segredo explícito, formal textualmente confiado pelo cliente e há o segredo implícito que resulta da natureza das cousas; não é necessário publicar o fato para que haja revelação, basta a confidência a uma pessoa isolada; o segredo profissional pertence ao cliente. Irretocável!