Um encontro de idosos num ambiente de medicina. Ou melhor, uma interação de pessoas experientes, prudentes e pragmáticas. O paciente é LPD, um homem de 79 anos que há anos deixou de trabalhar. O médico é o Dr. EKR que completou 80 anos com festa num apressado intervalo do horário de expediente no ambulatório do hospital.
LPD é o sexto paciente do dia atendido no sempre lotado ambulatório do hospital universitário e com horários raramente cumpridos. Inexiste possibilidade de cumprimento dos atendimentos dentro dos 15 minutos organizados pela Direção do hospital, exceto no primeiro horário. Aliás, o Dr. EKR orgulha-se da já incorporada à história institucional pontualidade diária da chegada ao ambulatório, jaleco totalmente abotoado, duas canetas no bolso superior, carimbo no inferior direito e estetoscópio pendurado nos ombros, computador já ligado pelo atendente. Podemos acertar o relógio pelo Bom Dia! do Dr. EKR dizem os colaboradores.
Há uma leveza na disposição ao trabalho do Dr. EKR, muitos dele já ouviram do Dr. EKR que ele não trabalha, exerce atividade prazerosa. Não infrequente, o Dr. EKR interrompe de imediato qualquer questionamento sobre sua ainda permanência no cotidiano do ambulatório, costuma argumentar que é o que pode, deve e quer fazer para ter idade biológica menor que a cronológica.
O Dr. EKR é um patrimônio do hospital, só falta a plaquinha, brincam com ele. Metódico, reserva uma hora cronometrada ao final das tardes de segunda a sexta-feira, após a sessão de ginástica, para manter-se atualizado tecnocientificamente, cada vez mais grato pelas facilidades proporcionadas pela internet. Ele sabe que a vivência continuada com os doentes preserva a motivação para o estudo e favorece a qualidade de sua análise crítica sobre a integração entre o clássico e a inovação.
Os poros do seu filtro analítico foram calibrados ao longo dos anos, ele chama de maturidade profissional. Os jovens médicos gostam de discutir casos complexos com ele, o que é recíproco, o Dr. EKR tem consciência do benefício pedagógico para si que resulta do convívio com as gerações mais novas de médicos. Ele tem em mente que a realidade de uma geração ensina a outra funciona em dupla mão de direção.
O Dr. EKR não tem pressa de terminar a tarefa diária no ambulatório, ele chama de seu ritmo sinusal jamais taquicárdico. Evidentemente, tem suas características pessoais, ele é empático a sua maneira, aprendera a ser tolerante com pacientes, mas não desiste facilmente de renovar esclarecimentos quando eles se manifestam “anti-medicina validada”, sabe que não são atitudes “anti-médico” e têm causas reversíveis pelo paternalismo brando.
O Dr. EKR desenvolveu noção acurada sobre o significado ético de imprudência no processo de tomada de decisão. Tantos anos de profissão fizeram dele um mestre em flexibilizar ao limite da prudência os altos graus de rigidez da visão tecnocientífica para viabilizar adaptações pretendidas pelas individualidades leigas.