A função uterina como representação simbólica da potencialidade da maternidade num ambiente resguardado para a integração da herança genética desde os ancestrais e eventuais influências do meio ambiente está alinhada
fundamentalmente à presença de um tipo de músculo liso revestido externa e internamente. Ela convive com previstos como a gestação e imprevistos como o abortamento e doenças em si como a endometriose ou no concepto como uma cardiopatia congênita. Ela serve, mais recentemente, para “empréstimo”, popularmente conhecido como barriga de aluguel, portanto, com um uso contemporâneo em práticas de reprodução assistida por meio de gestação de substituição.
Ademais, a função uterina está historicamente ligada ao termo histeria, uma daquelas interpretações equivocadas e discriminatórias que a medicina coleciona. Essa associação indevida tem raízes numa atitude médica patriarcal e ilustra como interpretações profissionais podem ser influenciadas por estereótipos de gênero, levando a compreensões limitadas e frequentemente prejudiciais de questões de saúde feminina.
Feminicídios e outras formas de violência contra a mulher podem ocorrer em momentos críticos relacionados à função uterina, como gravidez, complicações no parto ou intenções sobre aborto. Há evidências que mulheres vítimas de relacionamentos abusivos em período pré-parto têm mais chance de serem mortas pelo parceiro íntimo, especialmente em locais onde prevalecem políticas restritivas ao acesso ao aborto (DOI:
10.1097/XCS.0000000000001019).
Estes eventos envolvem o (des)respeito ao direito à autonomia sobre o próprio útero e, frequentemente, refletem desigualdades de poder e heteronomia sobre o corpo feminino. De vez em quando um excesso de presenças provoca manchetes e atenção pública, por exemplo, sobre o nascimento de quíntuplos.
Útero é, pois, biologia, ciência, arte, mente e respeito. No mínimo, temos que reconhecer uma dualidade do útero como um órgão com função biológica específica e símbolo cultural e social de maternidade e feminilidade. O útero, pois, não deve ser visto apenas através de uma lente biológica, mas também como uma fonte de estudo e reflexão que envolve múltiplas disciplinas e perspectivas. Essa visão multidimensional é importante para uma compreensão abrangente da saúde reprodutiva feminina e da importância do útero em contextos sociais, culturais e científicos.
Abortamentos espontâneos podem ocorrer devido a diversos fatores, como anormalidades cromossômicas, desequilíbrios hormonais, infecções ou condições médicas maternas. Estes eventos têm sido amplamente estudados pela Ginecologia, que, atualmente, oferece métodos para reduzir sua incidência e proporcionar suporte adequado às mulheres afetadas. Na maioria dos casos, a mulher que sofre um abortamento espontâneo enfrenta a perda inesperada de uma gestação desejada, vivenciando um luto significativo e doloroso que nem sempre é reconhecido ou compreendido pela sociedade. Essa perda é sentida de maneira profunda, proporcional às expectativas e esperanças depositadas na gravidez, e demanda um reconhecimento mais amplo e empático para proporcionar o suporte emocional necessário. A interrupção espontânea de uma gestação, ou abortamento natural, é tipicamente vista como um acontecimento biológico que raramente suscita questionamentos éticos ou legais, a menos que haja circunstâncias que sugiram intervenção.