A Bioética da Beira do leito entende que os diferentes conceitos de saúde não são excludentes entre si, pois cada um deles pode se encaixar melhor em determinadas práticas com distintos focos, assim admitindo permissibilidade moral para todos os entendimentos. A legitimidade da pluralidade ajusta-se, inclusive, para a aplicação da Bioética principialista, pois na atenção à beneficência pode bastar uma deficiência de função de um órgão e para a autonomia conta muito o bem-estar do paciente.
A concepção de saúde com habilidade de adaptação e autogestão traz um paradoxo na conexão médico-paciente. A medicina tem o poder de promover saúde física, emocional e social perante CIDs, porém os benefícios carregam riscos de provocarem adversidades biológicas em um destes setores com preservação dos demais e necessidades de mudanças temporárias ou permanentes na vida do paciente que são passíveis de serem entendidas pelo paciente como insuportável dano, indesejado enfrentamento de situação difícil e incômodo comprometimento da liberdade em relação ao outro. A medicina preventiva é pedagógica neste contexto ao inserir o conceito de fator de risco para doença.
Quando um Não doutor acontece, a contrariedade à recomendação correta sob o ponto de vista científico figura-se como o médico pendurado na lâmpada (ciência) no teto destituído da escada (o paciente). Se o respeito à tecnociência sustenta a beneficência da conduta recomendável, a preocupação com a receptividade humana à aplicação no processo decisório inicia-se com o respeito à não maleficência possível na conduta aplicável e termina com o respeito ao direito do paciente a consentir ou não na conduta consentida ou na conduta contrariada. Tanto esforço diagnóstico para nada, dirá o médico frustrado com o exercício do seu dever investigativo, é meu direito manifestar que a minha expectativa é outra, dirá o paciente. A Bioética assiste no intransitivo.
A Bioética da Beira do leito alerta que a passagem responsável da condição de leigo para a de médico não pode deixar num plano inferior de consideração que o hoje de procurar atendimento médico não significa exatamente que pacientes com dor e sofrimento renunciem invariavelmente ao ontem de vontades, pretensões, interesses a serem atingidos e protegidos, profissão, função familiar e social, direitos e deveres habituais que podem por efeito da medicina vir a ficar temporariamente não exercidos. Afinal “ordem médica” é voz de comando de exigências de condutas terapêuticas/preventivas e eventuais desobediências colocam um peso no ombro de difícil convivência à custa da ansiedade (temor com o futuro) e da culpa (pelo sentido de insubordinação).
Proibições médicas sustentadas por evidências ou por excesso de cautela (item da medicina defensiva) afetam a pessoa do paciente, outras pessoas e o manejo de coisas. Bem necessário? Mal necessário? Cada cabeça uma sentença. Na evolução do tratamento/prevenção, tudo na vida do paciente pode permanecer/retornar ao ponto pré-diagnóstico ou sofrer ajustes mais ou menos impactantes na saúde física, emocional e social. Talvez nada volte a ser como antes, mas tudo pode ser melhor como nunca foi, por exemplo, o prognóstico sobre expectativa de vida em função de correções/controles do (ainda)subclínico.