É de se acentuar no tema da bilateralidade em tomadas de decisão que a autonomia de relação, especialmente pela representação familiar, tem forte impacto sobre posicionamentos na “contramão” do médico/medicina pelo paciente, provocando quer flexibilizações e dissuasões com movimentação do Não para o Sim, quer rigidezes que reforçam o Não.
É da vivência no ecossistema da beira do leito o testemunho profissional da ocorrência de multiplicidades de instâncias no decorrer dos atendimentos envolvendo mesmo paciente e equipe, umas mais, outras menos admissíveis da ordenação máxima do respeito ao princípio da autonomia exercido pelo paciente. De fato, considerando que se conhece como começa uma conexão médico-paciente, mas não como se desenvolverá, face aos meandros evolutivos, costumeiras variações de contexto tornam-se conjunturas de influência sobre o manejo da dualidade autonomia-beneficência no âmbito da autodeterminação. Elas são devidas, não somente a (in)suficiências de níveis de certeza/incerteza sobre tecnociência, como também ao caráter/personalidade/temperamento dos bióticos envolvidos, vale dizer, da força do entendimento sobre risco-benefício e sobre direitos e deveres.
O exercício da prudência em relação ao que possa ser entendido como adversidade da conduta -de natureza biológica, como perda de função de órgão ou interpretativa de acordo com a vida pessoal do paciente, como recusa religiosa à transfusão de sangue- é essência da imperiosidade do consentimento pelo paciente, não importa a legitimidade tecnocientífica da recomendação médica e presumidos bons efeitos sobre qualidade de vida e sobrevida.
Habitualmente, pensamos/respeitamos sobre o direito do paciente consentir ou não com o recomendado pelo médico com foco sobre necessidades sequentes de aplicação de métodos diagnósticos, terapêuticos e preventivos no processo de atendimento às necessidades de saúde. Ilustram indagações como Você consente em realizar um exame de imagem? Você consente com uma cirurgia? Você consente com uma fisioterapia pós-operatória? Estatisticamente, é majoritária a resposta Sim pelo paciente e muitos Não são tão somente provisórios, reversíveis por absorção do “nocaute da má notícia”, confirmação da conduta por uma segunda opinião, ou mesmo pelo agravamento clínico da doença.
Por outro lado, quando não há a presença do médico pós-recomendação aguardando uma decisão e disponível para um diálogo esclarecedor, recomendações como mudanças de hábitos etiopatogênicos de adversidades, comumente, sujeitam-se ao consentimento ou não pelo diálogo tão somente um solilóquio.