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1290- Em detrimento de. Privilégio e Bioética (Parte 14)

Nem sempre é fácil reconhecer e equacionar que a modelagem normativa teve o propósito de camuflar privilégios no ecossistema da beira do leito com tantas possibilidades de justificativas contemporâneas sobre atender mixagens de beneficência, não maleficência, respeito à autonomia e atenção à ética da responsabilidade pela qual deve-se responder não somente pelas intenções ou princípios, mas também pelas consequências dos atos tanto quanto é possível prevê-los, conforme formulado por Maximilian Karl Emil Weber (1864-1920). Por outro lado, percentual de manifestações de médico(a)s sobre exclusão por privilégio a outrem carecem de base sólida sendo motivadas por um querer ser que creem, indevidamente, que já alcançaram, num salto de subjetividade visando a não perderem o bonde do pertencimento. Contudo, não há razão para animosidade pois ainda há muito de distância a ser percorrido para uma reconciliação meritória com o dedo selecionador.

A Bioética da Beira do leito entende que a redação dos artigos do Código de Ética Médica com o caput É vedado ao médico contribui para uma cultura de desconfiança do comportamento médico, matéria-prima para a constituição de privilégios “preventivos” institucionais, ou seja, supostamente justificáveis como salvaguardas a inconveniências atitudinais e a desrespeitos a conclusões científicas sobre segurança do paciente. Algo como um paternalismo forte, pois coercitivo e proibitivo, que desconsidera o respeito à autonomia profissional.

O imperativo É vedado subentende a  possibilidade da transgressão e assim, o aspecto deontológico sobrepõe-se a uma concepção de “Estou ciente” de minhas responsabilidades vindas do interior, da consciência profissional, conforme o Princípio fundamental II do Código de Ética Médica vigente:  O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional.

Está bem que cada um é cada um conforme a sabedoria popular, há médico (a)s (as) e médico (a)s (as), não existe um só ideal de médico (a) embora todos tenham suas qualificações, e por isso, a Bioética da Beira do leito pode entender aceitável a coleção de É vedado no Código de Ética Médica: causar dano, deixar de assumir responsabilidade, deixar de atender, deixar de comparecer, deixar de esclarecer, deixar de cumprir, desrespeitar, corromper, abandonar o paciente, etc…. Todavia, é construção que carrega objetivo punitivo para enquadramento num artigo para subsidiar penalidades por más condutas, não exatamente pedagógico para orientar o médico(a). Esta redação ao pé da letra, infelizmente, não imuniza para situações de eticopatia.

Expressões de naturalidade de aceitação da cultura do privilégio podem ser observadas no ecossistema da beira do leito em função de como cada um lida com a relação confiança no profissional/equipe-segurança do paciente/instituição de saúde. É comportamento que admite o paradoxo de sorites formulado por Eubulides de Mileto no século IV aC, ou seja, se 1000 grãos formam um monte (um privilégio), quanto deve ser reduzido para não mais ser classificável como um monte? 428? 359? 175? Zero? Ou, ao contrário, qual é a quantidade de grãos (discriminações) que faz o conjunto vir a se tornar um privilégio? É preciso caracterizar convenientemente qualquer situação que possa representar um privilégio em função do alerta de Dwight David Eisenhower (1890-1969): Valorizar privilégio acima de princípios resulta na perda de ambos. Uma atividade política institucional é uma decorrência humana desta realidade.

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