Décadas de atividade no ecossistema da beira do leito numa transição alongada entre os séculos XX e XXI permitiram-me testemunhar um magnífico progresso da medicina necessitado de um colegiado de profissionais para domínio de variadas competências a fim de prover excelência (a)caso a (a)caso clínico.
Equipes profissionais constituíram-se em epicentros de pesquisa clínica qualificada, tomada de decisão prudente e difusão de aplicações zelosa, sustentados em fundamentação científica alinhada à transdisciplinaridade, ensejando uma reunião do eu e do tu em um nós, um conjunto maior do que a soma dos seus membros pela alternância, ora de expositor ora de receptor de saberes e de sabedorias.
O testemunho participativo convenceu-me que a organização do exercício profissional em equipe é uma reconstrução permanente. Ela se faz, obrigatoriamente, segundo uma integração de aspectos bióticos e abióticos.
Em relação aos bióticos, os profissionais partícipes da equipe apresentam-se com competências e incompetências tanto originais quanto evolutivas pelo desenvolvimento de novas fronteiras entre o rotineiro e as inovações, desafiadoras e motivadoras de aproximações ou distanciamentos da expertise, pelas variações de interesses pessoais e institucionais e pelas decorrências de uma “naturalidade” de progressão de um trio de idades: a) a profissional – “envelhecimento do número do CRM”- , b) a cronológica – “envelhecimento matemático do corpo e mente” e c) a biológica – “cada órgão com seu nível de envelhecimento”.
Em relação aos abióticos, as recomposições seguem as atualizações tecnocientíficas cada vez mais aceleradas do estado da arte, com surgimentos e modificações de métodos diagnósticos, terapêuticos e prognósticos exigentes de sucessivos ajustes de infraestrutura humana e organizacional. Cada inovação tem sua curva de sucesso universal e local com proporções de superposição entre as projeções apriorísticas e as realizações. Nas últimas décadas, reduziram-se os períodos de tempo de renovação tecnológica e consequentes necessidades de novas curvas de aprendizado.
Apresentar-se no ecossistema da beira do leito contemporânea com competências e incompetências significa que cada profissional da saúde é uma reunião de consecutivos momentos combinatórios de conhecimentos, habilidades e modos atitudinais. A continuidade tem como ponto primário de referência o período de cerca de 10 anos que vai desde o início da graduação ao final da pós-graduação como Residência médica, em que ocorre o maior salto quantitativo das incompetências para competências, especialmente após o internato. Depois, o salto se torna especialmente qualitativo dentro de uma especialidade e área de atuação. Aquisições de competências face à abrangência e à profundidade atuais dos saberes das ciências da saúde implica obrigatoriamente em separação de outros potenciais de competência que se juntam às incompetências originais.
A conscientização sobre a dualidade competência/incompetência individual é fundamental para que cada formação de equipe quer de modo mais fixo quer com associações de acordo com as necessidades de atendimento torne-se o mais eficiente, flexível, criativa e produtiva. Naturalmente, o dia-a-dia das convivências vai selecionando empatias, superposição de valores, respeito a estilos, certezas de cooperação dedicada e eficaz e facilidade na intercomunicação, segundo premissas éticas e morais.
A definição de equipe pode ser tão simples como pessoas fazendo algo juntas. É suficiente. O que vale é a maneira com que se dá o junto. Tendo como idealidade um “dream team”, o importante é que seus membros possam estar os mais próximos profissionalmente como a tinta da parede, o que tende a evitar malogros causados por má distribuição de tarefas, objetivos indefinidos, desconfianças internas, relutâncias a mudanças, equívocos de decisão e conflitos de personalidade. Numa equipe, há líderes e liderados, há os que tomam decisões e as executam, há os que fazem de modo isolado, só decidem ou só executam compreendendo seu ciclo mais iniciante ou mais amadurecido e levando em consideração tarefas a cumprir, limites a respeitar, desempenhos a alcançar, prazos sem margem de variação.