O assim assessorado desenvolvimento de um pensamento crítico pelo profissional da saúde sobre a aplicação da sua competência (conhecimento + habilidade + atitude) não somente é fator contensor do cienticismo, tecnicismo e autoritarismo moral, como também facilita reconhecer o poder do paciente para manifestar suas expectativas e declarar “seus melhores interesses”.
Salve o diálogo! Pelo duplo sentido do salve como verbo e como interjeição, e enquanto instrumento na busca de acordos, o diálogo representa a ferramenta do binômio ciência-humanismo para a preservação do respeito ao saber, à sabedoria e à organização em amplos sentidos e que subentende 26 combinações (duas a duas, três a três, quatro a quatro ou as cinco) entre autorizados ao diálogo no contexto do Pentágono da beira do leito.
Um constructo de idealidade corresponde à cooperação ativa, coerente e harmônica entre os cinco ângulos, todavia, a complexidade técnica e humana da atenção à saúde torna inevitável a presença de contraposições, a ocorrência de avaliações (valências) desiguais para mesma proposição. As linhas pontilhadas expressam a necessidade de passo-a-passo cauteloso.
Acresce que não cabe pretender que os agentes dos diálogos visando a afunilamentos de pontos de vista e de compromissos em direção ao consenso sejam absolutamente neutros, eles têm suas preferências e objetivos, mas, a imparcialidade deve ser valorizada acima de intenções de direcionamentos e de conflitos de interesse, habitualmente racionalizados como sob boa-fé. O comprometimento com imparcialidade no ecossistema da beira do leito sustenta o legítimo esclarecimento técnico sem o qual fica prejudicada a autêntica liberdade de expressão reativa à tecnociência pelo paciente.
Nos diálogos efetivados na conexão entre os ângulos profissional da saúde e paciente/familiar do Pentágono, um pluralismo cognitivo (percepção, memória, raciocínio, juízo, imaginação, pensamento e linguagem) tem o potencial de contaminar a emissão/recepção da tecnociência validada com a falta de neutralidade. Imposições na condução da indicação de transfusão de sangue de alto impacto para reversão de mau prognóstico clínico em pacientes Testemunha de Jeová ilustram.
Salvo em situações de urgência/emergência, prazos quantum satis para o elucidativo clínico, para adequações do tempo de respostas esclarecidas dos pacientes, são necessários para aclarar os pontos iniciais, intermediários e finais de decisões, inclusive porque o bater o martelo da “tomada”, um ato concreto, não infrequente sucede a desafios, dilemas e conflitos – que, dificilmente, não deixam pontas soltas. Assim, o atencioso proceder (pro-ceder) pelas expectativas e possibilidades tem duplo efeito humano: além de bem qualificar o tecnocientífico para a saúde do paciente, tem benéfica contribuição para a saúde do profissional da saúde, não somente pelo controle da ansiedade profissional pela presteza na resolução de contraposições, como também para redução de subsequentes sensações de culpa, vale dizer, para prevenção do burnout na “dedicação”, talvez uma síndrome já endêmica entre profissionais da saúde se admitirmos formas subclínicas desta exaustão por alto consumo de energia psíquica.
A velha analogia com o sacerdócio impacta na fisiopatologia alinhada ao devotamento profissional. O termo burnout foi lançado por Herbert Freudenberger (1926-1999) nos anos 70 do século passado, mas, em 1904 em Aequanamitas, William Bart Osler (1849-1919) já se referia a : “… há perigos com o excesso de trabalho…” e aconselhava comida, sono e disposição agradável como requisitos para a saúde mental e física do médico.