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1228- Trans e pós-humanismo na beira do leito. Uma leitura com o apoio da Bioética (Parte 29)

 

XIII

Bioética e perspectivas de conexão médico-paciente no transumanismo

Os recursos modernos devem aguçar os órgãos dos sentidos do médico para ao menos na ciência médica a máquina não vença o homem. Há o desejo de restabelecer o hábito quase extinto do médico e amigo da família (Prefácio do livro Olho Clínico escrito por Erwin Risak da Escola Vienense em 1936)

 

A participação consultiva da Bioética no ecossistema da beira do leito sob impacto do transumanismo é desejável pela previsão do surgimento de novas doenças, variações de expressão das existentes e modificações do conceito atual de doença: combinação de um conjunto formado por

a) disfunção;
b) dano que causa sofrimento ou incapacidade, explicável, em princípio por fatos acerca da biologia humana;
c) além de um controle consciente direto da pessoa.

A rejeição biológica a transplantes homólogos e a infecção em próteses valvares podem ser vistas como representantes de um através do humanismo (transumanismo) incorporado no século XX e frutos de novas interfaces entre biológicos e artificiais que dão uma dimensão de como a tecnociência é ao mesmo tempo fator de solução e de problema exigentes de uma esclarecedora comunicação médico-paciente.

O passo-a-passo que atravessa o ecossistema da beira do leito já testemunhado faz perceber, por exemplo, como novas distinções fisiopatológicas, terapêuticas e preventivas ligadas ao transumanismo tornam necessárias transformações proporcionais no ensino da medicina – e em especialidades- para satisfazer a imperiosidade do alerta do sempre atual William Bart Osler (1849-1919): não se ensina sem ter um paciente como texto. E como se sabe, cada emissão de texto pelo autor provoca multiplicidade de captação pela leitura em momentos distintos.

Bioamigo, você pode se imaginar o doutor de seres cogitados como decorrência do transumanismo tendo que estabelecer uma conexão médico-paciente responsável que, paradoxalmente, seja “menos humana” porque predomina a atenção tecnológica? Eric Jeffrey Topol (nascido em 1954) vaticinou em 2018: nos próximos 10 anos será possível  – em circunstâncias especiais – monitorar quase todos os órgãos do corpo, à medida que empresas começam a produzir nanossensores que possam ser inseridos na corrente sanguínea, assim reduzindo a necessidade do médico.

Será que a imortalidade do legado de Hipócrates de 26 séculos seja preservada? Pois o modo de desenvolvimento do pós-humano na medicina – e ciências da saúde em geral-, em seus aspectos especulativos e práticos, é risco de esquecimento que o Pai da medicina com sua visão de futuro fez da pequena Cós no mar Egeu uma ilha de Utopia sobre a conexão médico-paciente de que resultou o afastamento dos deuses das orientações sobre saúde pelo entendimento que medicina é cuidado de um ser humano por outro ser humano. Passaríamos a ajustar para cuidado de um ser pós-humano por outro ser pós-humano.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A Bioética em seu mister de aprofundar-se em prós e em contras para destacar decorrências de escolhas obriga-se a considerar o quanto a concepção de humanidade transformada “sempre para mais eficiência”, poderia implicar em desrespeitos à dignidade humana (abusos por ultrapassagens “narcísicas” de limites, em propósitos eugênicos de embriões com habilidades superiores e em indevidos controles da vontade de segmentos da população que não tenham as oportunidades de usufruto dos aperfeiçoamentos por comprometimento do princípio da equidade.

Ciborgues perdem as influências do patrimônio genético habitual que é transferido de pai para filho sem nenhuma intervenção técnica sobre os genes, o que impacta na moralidade e traz questões de responsabilidade/liberdade no ecossistema da beira do leito. Sempre haverá o potencial de descontroles e de inevitáveis dilemas sobre Quem somos? Como somos tratados? Como pensamos sobre nós mesmos? Um risco para novos preconceitos e estereótipos.

Muito embora, pareça claro que as decisões sobre transformações mais radicais causadas pela tecnociência estejam confinadas a “Vales do Silício” e a “Canetas de Governos”, são úteis exercícios “menos empoderados” sobre o tamanho dos poros para filtrar as respostas sustentados pela Bioética. Na busca de um improvável consenso energizado por um idealismo sobre bem para a humanidade que possa estar embutido no trans/pós-humanismo, a maior previsibilidade de dissensos parece encontra explicação na sabedoria de Charles de Montesquieu (1689-1755): Todos nascem iguais, mas a sociedade não deixa assim continuar. Mas, sempre tem um mais, talvez  não caberá o nascem iguais para os ciborgues de futuras gerações.

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