A importância da tecnociência como integração poderosíssima para a vida contemporânea foi reconhecida pela criação do termo pelo filósofo belga Gilbert Hottois (1946-2019). Como técnica e ciência não possuem valorização intrínseca, o seu imperativo infiltra-se na humanidade segundo a visão de cada ser humano e inclui o junguiniano (Carl Gustav Jung, 1875-1961) inconsciente coletivo.
O desejo do ser humano de viver plenamente e para sempre sem sofrimento e a insatisfação com as distâncias abissais da perfeição motiva agitadas relações entre tecnociência e ética no contexto evolutivo da saúde que expõem as vulnerabilidades naturais do ser humano aos métodos artificiais. Por isso, a exigência dos valores cognitivos para calibragens entre responsabilidade e liberdade com a tecnociência. Inclusive a respeito do paradoxo de fazer opções reconhecidamente humanas sobre o desenvolvimento de seres cada vez mais distanciados do original Homo sapiens.
As incorporações no corpo humano de dispositivos “maquinários” – recentemente Bill Gates (William Henry Gates III, nascido em 1955) falou sobre substituição do smartphone por tatuagem eletrônica- e/ou sua dependência a máquinas relembra que o “Não faça o mal” do Juramento de Hipócrates foi aproveitado pelos Direitos Humanos e pela Bioética. Como as inovações costumam deixar em segundo plano o potencial de dano por amalgamar desejo com direito humano, a Bioética contribui com o olhar atento e crítico.
As distribuições entre bem e mal em movimentos culturais contemporâneos ligados ao humanismo justificam a assimilação dos prefixos trans e pós ao humanismo em meios acadêmicos. A linguagem de apoio do par de prefixos favorece a preservação do caráter evolutivo da ciência como atividade humana em prol do conhecimento, em princípio visando ao bem da humanidade, mas que não está isenta de riscos de danos pelo seu instrumento que é tecnologia e, por isso, exigente de legitimidade ética.
Existe um mundo real de apoio aos deveres trabalhosos pelo profissional da saúde por meio de máquinas e algoritmos, a fim de, por exemplo, interpretar imagem radiológica, analisar eletrocardiograma, predizer evoluções a longo prazo, todavia, há muita hesitação sobre o uso da inteligência artificial para tomada de decisões morais/éticas, ou seja, prevalece o entendimento que somente um ser humano deve lidar com dilemas morais ou éticos e controvérsias de juízos para outro ser humano.
A ideia de um tipo de ser por vir (já vindo, inclusive) tendo componentes não humanos, numa mistura aberta entre natureza e cultura representa um guarda-chuva que abriga o transumanismo e o pós-humanismo. É necessário abri-lo pela chuva de interrogações que se acumulam sobre temas como raça. classe, gênero, sexualidade, etnia, religião e idade. Vale a preocupação com o abrigo a reações de fascínio incentivador ou de abatimento apocalíptico sobre o que se passa em nosso planeta, especialmente, o influenciado de modo multidimensional pela tecnociência, como o que pode resultar de algoritmos autônomos