PUBLICAÇÕES DESDE 2014

1214- Trans e pós-humanismo na beira do leito. Uma leitura com o apoio da Bioética (Parte 15)

 

 

 

VII

Bioética e o intercâmbio entre a beira do leito e a ilha da Utopia

Tudo que se possa imaginar é real, Pablo Picasso (1881-1973)

 

Bioamigo, é difícil nos abstrairmos do conhecimento atual para nos colocarmos na pele do médico do século XIX imortalizado pelo Realismo Social de Sir Samuel Luke Fildes (1843-1927) no quadro The Doctor (1891). Aliás, exposição hoje, vejam só, interpretável como quebra de sigilo profissional. Bioamigo, tire uma self de você, um The Doctor do século XXI, expressando toda atenção com seu paciente na beira do leito, publique numa rede social e aguarde uma cartinha sobre infração ao Código de Ética Médica. Ou seja, não persistirá para séculos futuros saberem como era antigamente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O colega da pintura dispunha dos órgãos dos sentidos para captar sinais/sintomas e do cérebro para processar as informações e cotejar com sua experiência e com o escrito em alguns livros fundamentais da época. Sabe lá o que ele poderia estar pensando sobre a qualidade da medicina que praticava, sobre o que estaria sonhando poder fazer, além de se sentir na obrigação de estar ao lado da paciente em sua moradia, mas fica para a imaginação dos apreciadores da pintura. O que dá para perceber é que sua cabeça “pesava”, razão para apoiá-la no braço esquerdo.

O século XX acelerou a disponibilidade de métodos beneficentes permitindo a reconfiguração da atenção às necessidades da saúde de uma forma tão continuada que resultou na recorrente expectativa de “novidade para breve” para substituição ou mescla ao clássico.

O profissional da saúde internalizou que as condutas praticadas são, na verdade, sequências de provisórios. Muito do que aprendi como idiopático/criptogenético passou a ter causa conhecida e niilismos terapêuticos reduziram-se nestes meus 54 anos de formado, registre-se, de modo cada vez mais acelerado. Consolidei a ideia de uma evolutiva maior densidade de progresso tecnocientífico para cada vez menores períodos de tempo. Razão para uma Bioética ágil, contínua e bem capilarizada no ecossistema da beira do leito e sedenta de um Oxalá!

Não é verdade, bioamigo, que quando lida com diagnóstico diferencial ou com validações terapêuticas  você sonha como seria útil algum acréscimo conceitual ou biotecnológico? Desde a formatura, a fim de elevar o nível de sustentabilidade do fazer o bem clínico melhor para o paciente, a tendência de sonhar indisponibilidades transformadas em disponibilidades válidas significa que a medicina tanto teórica quanto prática é uma permanente ultrapassagem de sonhos acordados para realidades concretas. A Bioética presta-se para participar de escolhas que evitem pesadelos.

Animados pelas concretizações dos anseios obtidas com a participação de complexa rede globalizada de observadores, descobridores e inventores, os médicos irmanados como filhos universais de Hipócrates, o Pai da medicina, motivam-se a praticar atualidade tecnocientífica ao mesmo tempo com a mente num contexto de utopia.

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