– Professor, tudo que me proponho a fazer com o paciente me despeja preocupações, o que será que está errado comigo?
– A Residência médica está, então, bem cumprindo um de seus papéis.
– Qual papel?
-Desenvolver o manejo da preocupação profissional.
–Mas não é nada agradável.
-Não mesmo, você tem razão, ocorre uma associação entre preocupar-se, inquietar-se e tornar-se ansioso.
– Exatamente, professor, parece que a profissão me ameaça.
-Mas considere o que o filósofo Michel de Montaigne disse: Minha vida tem sido cheia de terríveis infortúnios, a maioria dos quais nunca aconteceu.
O diálogo curto e grosso no corredor do hospital atingiu direto um aspecto sensível da responsabilidade profissional na atenção às necessidades de saúde. A preocupação profissional tem suas formas de impacto no jovem médico e sofre ajustes periodicamente, sob impacto de fatores ligados à interação do ser humano com estratégias e processos.
O nosso interlocutor, um representante da geração do kit 5 C: Carimbo, Computador, Celular, Caneta e Confiança em diretriz clínica, que em relação a gerações prévias é mais tecnológica, mais imediatista a respeito do sucesso, mais obrigada a dar satisfações ao paciente e muito mais bombardeada com informações sem os devidos filtros, conscientizava-se sobre a incorporação e manejo da preocupação.
Esta preocupação pessoal com a preocupação profissional é imperiosa para a imperiosa distinção entre entender-se um agente de aplicação da medicina – ou ciências da saúde, em geral-, sensível ao raciocínio crítico, à objetividade e à aceitação das realidades e comportar-se como um possuidor da medicina e isento do equilíbrio dado pelas limitações.
O profissional da saúde trabalha muito mais em equipe atualmente. Não obstante, persiste necessitado de tomar decisões próprias. Cabe, então, a figura desde Giles Deleuze (1925-1995): sucede uma solidão extremamente povoada e ela tem efeitos, inclusive em ziguezagues, um deles é a preocupação.
O desenvolvimento multifacetado da preocupação (pré-ocupação pela mente) pelo profissional da saúde acelerou-se, ultimamente, com o percentual expressivo caracterizado como (a)caso clínico da renovação de cenários na beira do leito contemporânea. Nenhuma novidade nesta reação, mas cada vez mais a coleção de preocupações cresce pela pluralidade de circunstâncias até há pouco impensáveis.
A clássica e impressionante pintura “The Doctor” de Samuel Luke Fildes (1843-1927) expressa uma mistura de devoção e preocupação perante a escassez de recurso beneficente que permitia pouco mais do que o contemplativo em resposta às esperanças dos pais da criança enferma. Humanismo, porém ineficiente, um alerta a respeito da hoje eficiente tecnociência carente de humanismo.