A fundamentação registrada como princípios aponta para o dever profissional com o que é superior. Podemos entender melhor no sentido tecnocientífico e no sentido moral da conexão médico-paciente-medicina. De certa forma, incorpora o pelo menos bom para proteção e acolhimento.
Bioamigo, classificar como acima do bom como sugerem os princípios fundamentais V e XXVI do Código de Ética Médica exige vivência no tema, juízo crítico apurado e comprometimento com objetivos, pois se bom já é um adjetivo vago, a junção com um advérbio faz de acima de bom uma locução ainda mais exigente de discernimento. Afinal, designar por melhor suscita muitas indeterminações, uma delas, bem prática, melhor para quem? Não nos esqueçamos que aprimoramento profissional e progresso científico são uma continuidade onde sucessões de hoje devem superar o ontem.
É impossível estabelecer uma linha de corte consistente para avaliar o profissional da saúde como de fato aprimorado ou agente de novidades no topo da utilidade. Um pontilhado desta linha é o fator tempo. Por exemplo, a síndrome do último trabalho publicado, estimulante de um imediato agora farei melhor, fala por si, pois suas decepções, não raras, ressaltam o valor da prudência pela maturidade profissional e pelo respeito à própria experiência.
Como se sabe, a beneficência, validada e ajustada ao aprimoramento profissional, representa indubitável potencial de benefício, mas – sempre tem um mas- pode ou não resultar em algo bom, inclusive, pode vir a ser acompanhado ou até mesmo superado por algo mau. O tema iatrogenia é vasto.
O jargão boa evolução e má evolução da conduta cientificamente correta é tradicional em medicina. Os resultados sob forte influência biológica indicam que se conhece o ponto de partida – idealmente aprimorado – mas não se conhece de modo seguro as decorrências cogitadas.
Frustrações de expectativas ocorrem em ausência de nenhuma desconsideração ética, moral e legal. Assim, aprimoramento profissional e progresso científico articulam-se com validação sistematizada, compromisso com o método e não exatamente com garantia de resultado.
A contemporaneidade pretende o acima do bom na beira do leito como amálgama de pessoas racionais e razoáveis, capazes, livres para opinar e tomar decisões acerca do conhecimento atualizado, propensas ao consenso pelo poder de crítica ponderada a argumentos, tudo fundamentado em declarações e atuações honestas e em ausência de subterfúgios e conflitos de interesses.
A fusão do aprimoramento e do melhor benefício ocorre sob impacto de limitações cognitivas e sensitivas para percepção das diferenças mais finas. A vagueza predispõe a inconsistências – e daí a arbitrariedades -, por exemplo, aplicar uma rejeição a mau como critério de bom ou estabelecer uma fronteira sólida entre bom e acima do bom. Na verdade, a confiança é que costuma assentar um aviso de fronteira.
A Bioética da Beira do leito enfatiza que a significação do bom na beira do leito admite uma linguagem própria que inclui: indicado, recomendável, validado, de utilidade, eficiente. Articula-se com uma visão de necessidade face à existência ou à ameaça de algo mau, premente de ser atendida numa calibragem entre imposição tecnocientífica e livre consentimento humano.
Desde Hipócrates (460ac-370ac) há preocupação com a ligação entre determinado método conceitualmente bom e a fazer bem na prática. Atualmente, a Bioética auxilia pela exposição dos princípios da beneficência e da não maleficência. Assim, um mesmo método, quer um fármaco, um procedimento ou uma orientação sobre hábitos, considerado como indicado/recomendável/validado/de utilidade/eficiente pelo estado da arte, o melhor para recomendar, pode vir a ser, em função de individualidades do paciente, contraindicado/não recomendado/danoso/ inútil/ineficaz.
Por fim, bioamigo, toda excelência conceitual pode ser melhorada, justamente para reduzir as frustrações da prática, aliás a beira do leito ética é testemunha diária.