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420- Bioética e transgressão clamor da beira do leito

A Medicina reinventa-se com crescente rapidez desde há algumas décadas e assim persistirá com tanta inovação sendo criada e pesquisada. Por isso, o médico não deixar de pensar com a audácia dos desbravadores para lidar de modo exitoso com os obstáculos de toda mudança provoca.  É essencial que o médico ético saia com prudência da zona de conforto, compreenda novas explicações para o zelo do momento, ultrapasse limites da rotina, desrespeite respeitosamente certas então verdades, viole criteriosamente pontos do status quo sem que tal comportamento represente uma ameaça de violência ao paciente. Enfim, transgredir para progredir. Atualizações de diretrizes clínicas dizem bem o significado deste movimento beneficente.

Nos meus 50 anos de formado, vivenciei inúmeros ciclos de mudança de bagagem técnico-científica e de roupagem de atitude. Especialmente na Cardiologia, mas em todas as especialidades. Parte do que incorporara no decorrer dos seis anos de Faculdade persistiu útil, mas, evidentemente, tornou-se cada vez mais insuficiente. Assim, transgredi muito aprendizado pela premência de absorver continuadas aptidões articulando com perspectivas e possibilidades inseridas como metodologia diagnóstica, arsenal terapêutico e preventivo e projeção prognóstica.

A Bioética de Van Rensselaer Potter (1911-2001) é contemporânea a minha formatura. Entretanto, só mais recentemente deu-se o meu encontro com ela. A convivência facilitou-me enxergar com mais acurácia a diversidade do impacto da razão que é sustentada pelas evidências técnico-científicas em função da pluralidade da condição humana do paciente. Em outras palavras, percebi melhor como como o admitido e cientificamente justificado valor moral da beneficência como entendido pelo médico colide de modo não infrequente com a falta de um consenso moral  na sociedade sobre o significado de utilidade e eficácia no âmbito da aplicação da Medicina.

Após fincar a sua bandeira na beira do leito, a Bioética deu-me mais segurança para uma transgressão negociada, maior atenção a aspectos sociais  e  abertura e tolerância  a contraposições  ao validado na Medicina como a mais adequada dimensão de efeito. Fortaleceu-me a  capacidade de resposta a individualidades por meio de interpretações mais ousadas do Código de Ética Médica e  de leis pertinentes, sem as golpear acriticamente. Facilitou relacionar-me com as pessoas e as instituições, assegurando-me das minhas posições não consensuais e, ao mesmo tempo, atento ao meu desejo de soarem responsáveis, compromissadas, dignas de confiança.

A Bioética não é uma ideologia que aponta como a beira do leito deveria ser organizada. Ela precisa conter espírito crítico e cético para que possa ajudar o médico a uma condução pela ética médica contemporânea com pensamentos próprios e sensíveis à circunstância.

Pelo estímulo ao dinamismo intelectual, a Bioética contribui para evitar raciocínios clínicos reducionistas quais fluxogramas, alertar  para  o pseudo-conhecimento restrito a quadros didáticos em diretrizes clínicas – que parece compensar a má-formação profissional- e amenizar efeitos manada indesejados, inclusive, os provocados por conflitos de interesse.

Não se trata de posicionar a Bioética como um sustentáculo para o culto do personalismo, mas, para dar a firmeza ao capital cultural do médico tão preciosa em nossos tempos para exercer o mais adequado equilíbrio entre a cognição advinda das ciências da saúde e a capacidade de resposta sensitiva profissional à condição humana do receptor- o paciente.

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