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297- Bioética e objeção de consciência (2)

conscientiousobjectorHá 10 anos, a apreciação do australiano Julian Savulescu (nascido em 1963) da University of Oxford, atual editor-chefe do Journal of Medical Ethics, sobre objeção de consciência do médico permitiu cinco destaques editoriais do British Medical Journal. (Quadro) http://www.bmj.com/content/332/7536/294

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Crédito: http://www.bmj.com/content/332/7536/294

Após 10 anos, a objeção de consciência como recusa do profissional da saúde a prestar certo serviço médico em função de conflito com sua apreciação moral foi tema de um workshop (junho de 2016) na Suíça, inclusive com a participação do autor supracitado.

O encontro foi promovido pela Brocher Foundation, que tem o propósito de apoiar  cientistas interessados nas implicações éticas, legais e sociais do desenvolvimento da pesquisa médica e das biotecnologias http://blog.practicalethics.ox.ac.uk/2016/08/consensus-statement-on-conscientious-objection-in-healthcare/. Resultou um decálogo, resumido nos Quadros.

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O decálogo ilustra a conveniência do olhar da Bioética sobre a questão. Ideias sobre tribunais para análise moral, critérios nem sempre claros para reconhecer iminência de morte e heterogeneidades da condição humana sobre discernimento quanto a realidades de malefício provocam posicionamentos divergentes, antagônicos mesmo, embates entre visão mais liberal e mais autoritária da missão do profissional da saúde.

No atendimento hospitalar, estatal ou não, a questão da objeção de consciência agrega um fator “trabalhista”. Até que ponto o profissional da saúde num “ambiente coletivo” pode se recusar pela consciência a atender um paciente que não consente com a recomendação e insiste para a aplicação de uma outra, orientado por uma segunda opinião , por exemplo, ou, então, pode não aplicar um protocolo de exames entendido pela instituição como obrigatório para determinada suspeita clínica. As eventuais recusas suscitam a possibilidade de sanções de natureza contratual, inclusive a demissão do emprego.

O Código de Ética Médica vigente no Brasil é muito feliz quando associa nos Princípios fundamentais  impossibilidade de o médico renunciar a sua liberdade profissional (VIII), possibilidade de respeitar os ditames da sua consciência (VII) e obrigação de não praticar discriminação de nenhuma natureza sobre o ser humano (I). Evidentemente, “falta combinar” com as demais partes em várias situações como as acima mencionadas.

Assim, há clareza que os ditames de consciência não estão ligados diretamente à pessoa do paciente em si, mas a aspectos técnico-científicos decorrentes da atenção a sua saúde. O foco da consciência do médico está sobre análises de malefício reais ou em potencial do eventual ato médico. Assim se dá sobre as razões para não eliminar uma vida por um aborto legal, para passar de cuidados plenos para paliativos na terminalidade da vida, para não atender paciente Testemunha de Jeová pelo conflito que acontecerá a respeito de transfusão de sangue que represente a diferença entre sobrevida e morte transoperatória, para não se envolver com o suicídio assistido (ilegal no Brasil), para rejeitar participar ou manter em andamento uma pesquisa clínica com alto potencial ou já realidade de adversidade com relevante risco de morte.

Parece-nos suficiente  que o médico que deixe de praticar determinado atendimento por objeção de consciência registre suas alegações e providências no prontuário do paciente, evidenciando ausência de situações como sexismo, racismo e quetais injustificáveis. Na ocorrência de contestações no âmbito da Ética ou do Direito, esta documentação deverá subsidiar o juízo de autoridade pretendido por quem se sentiu prejudicado.

Contudo, um SOS Bioética entre nós precisa ser disparado para reflexões sobre convicções não habituais, a reboque não somente de títulos como Conscientious Objection in Healthcare: Referral and the Military Analogy, em recente número do Journal of  Medical Ethics http://jme.bmj.com/content/early/2016/09/29/medethics-2016-103777.full.pdf+html, bem como de propostas sobre compensação por serviços comunitários e sobre reciclagens reeducadoras- analogia a decisões de tribunais militares para convocados que manifestam objeção de consciência de servir como combatente de guerra sobre tarefas “fora da zona de combate”.  Destaque-se que na mesma  revista, houve a sugestão da concessão de uma licença válida por cinco anos para praticar a Medicina com possibilidade de manifestar objeção de consciência – no tema aborto, por exemplo-, conferido por um tribunal formado por representantes da Medicina, do Direito e da Bioética http://jme.bmj.com/content/early/2016/02/25/medethics-2015-102970.abstract. Algo CRM tal/OC tal!

Todos aqueles que se envolvem atualmente com a atualização do nosso Código de Ética Médica devem analisar com máxima atenção a pertinência tradicional da liberdade  para objeção de consciência nos princípios fundamentais.

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