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249- Bioética com cores brasileiras é indispensável

sisifoInsistimos. O Brasil precisa expandir e aprofundar a Bioética. É essencial para que o brasileiro disponha de uma caixa de ferramentas para manejar temas da Bioética que são incessantemente gerados pela multiplicação exponencial dos conhecimentos na área da saúde e da sofisticação das biotecnologias.

A renovação de conceitos, modelos e técnicas alocados com esperado rigor numa rede interdisciplinar em constante expansão provoca dilemas bioéticos. Em decorrência, torna-se necessário saber organizar um processo de tomada de decisão  que inclui bem identificar a gama de opções, ponderar riscos  por análise crítica sagaz e fazer seleções de utilidade e de eficácia, idealmente chegando a consensos.

O inglês Bertrand Russel (1872-1970) nos ensinou que a ciência pode estabelecer limites ao conhecimento, mas não deve limitar a imaginação. De fato, muitas imaginações da chamada ficção científica de outrora tornaram-se realidades científicas já bem conhecidas ou caminhando por passos céleres para o domínio pela ciência.

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Crédito: http://www.systembio.com/genome-engineering

A Bioética com cores brasileiras é indispensável como fórum para o desenvolvimento de valores bioéticos no campo da Saúde, para capacitar à clareza do exame em profundidade das questões conflituosas, para educar a respeito dos princípios tradicionais  que  sustentam  o direito à escolha sobre o que afeta a si (autonomia), a promoção do que é  bom  para a circunstância (beneficência), a evitação de danos previsíveis (não maleficência) e o amparo à equidade no provimento das necessidades de saúde.

Vínculos, nexos, interdependências, complexidades, superespecializações, inovações, tolerância, incompletudes, evidências, ordenações ético-legais são termos que surgem no decorrer dos processos de tomada de decisão perante conflitos de natureza bioética e que fazem reconhecer que não se deve admitir fronteiras estáveis entre saberes e entre sabedorias nos campos moral, social e político.necessemerg

 

 

Doenças, limitações físicas e intelectuais, entendimentos de qualidade estética motivam pesquisadores a desenvolver métodos para em prol da saúde, da inteligência, da aparência do ser humano. Aumentam velozmente  a disponibilidade de métodos para promover a correção de “defeitos de fabricação” e a “fabricação diferenciada”. Vislumbram-se  recém-natos não somente mais saudáveis porque foram embriões formados a partir de três doadores  de genes, como também mais habilidosos e mais bonitos  porque foram submetidos à seleção de genes. Alerta-se que o homem precisa evoluir para um cyborg (incorporação de habilidades de máquinas) a fim de não se tornar um ser secundário àqueles desenvolvidos pela inteligência artificial. Acena-se para a possibilidade de se conhecer o potencial de doenças que acometerão um determinado ser humano, no âmbito do projeto genoma e quem disse que todos vão querer saber? A marcha dos transplantes comemora a chegada dos 50 anos de ajuste do paradigma de morte – de circulatória para encefálica- , ao mesmo tempo que caminha no sentido de órgãos de animais “humanizados” e de ideias de estímulo à eutanásia como fonte de doação com vantagens de viabilidade orgânica em função da “hora marcada”.

A história das ciências em Saúde testemunhou muitas rupturas com visões tradicionais dadas pela teologia e pela filosofia. Desconsiderou-se a importância da concentração da mente no divino, na consciência destituída de razão e do conhecimento que de repente se impregna. Assim, se no passado contemplação, êxtase e revelação mostraram-se injustificáveis perante a racionalidade da ciência e suas evidências, o século XXI  progride com a ferrenha obrigatoriedade de justificativas éticas, morais e legais para a sucessão de mudanças radicais acerca da concepção, nascimento, vida e morte do ser humano cada vez mais algemado à tecnologia.

Estar com algemas tem o significado de não estar livre para decisões ao seu gosto. Imposições podem até representar um bom uso, o risco do abuso, todavia, é notório. O não consentimento é desrespeito e caracteriza violência.

Indústria  é termo que passou a carregar uma conotação de mau uso, de modo que pode-se dizer que a Bioética concorre para a formulação de juízos sobre o potencial de indústrias anti-éticas que deve ser cogitado a cada surgimento de inovações. Em outras palavras, cada validação pela ANVISA não representa um contrato apriorístico de utilização com o cidadão. Salvaguardas devem ser    observadas.

Portanto, a Bioética coopera tanto para uma tomada de decisão individual quanto no âmbito da gestão das coisas da Saúde. Lembrando sempre que não pode ser desconsiderada a brasilidade multicultural e pluri-étnica. Uma pergunta necessária é: Podemos fazer, mas devemos? Respostas mais afirmativas ou mais negativas podem caber justificáveis em diferentes cenários, em distintas sociedades, em variados recantos.

Por fim, é bom ficar claro que a Bioética rejeita qualquer acusação de obstrução de caminhos do progresso científico. Há clareza que a ciência é um trabalho de Sisifo e que a Bioética não tem predileção pela etapa do “rolar a pedra abaixo”. A Bioética preocupa-se é com as implicações, pois, previsibilidades de danos para a humanidade de modo geral e peculiaridades de objetivos, valores, preferências e desejos pessoais não podem ser ignorados.

Se por um lado, é verdade que The Global Burden of Disease Project  estimou em 2010 que cerca de 30%  do potencial de vida e bem-estar humanos perdeu-se  em função de mortes prematuras e incapacitações físicas e mentais, dado que estimula inovações reversoras, também é verdade que a “fase de mercado” é implacável juiz das conclusões de pesquisa clínica.

A Bioética não desvaloriza o pensamento científico inovador  que é sujeito a um imperativo moral da pesquisa e que é testado de maneira ética, mas preocupa-se com o pensamento do cientista que exagera nos benefícios para a vida, para a saúde e para o bem-estar, assim fechando os olhos para malefícios. Exoftalmia moral é que não deve faltar na Bioética!

 

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