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02-Segurança. A modernidade da não maleficência

A Não Maleficência é hipocrática. Pela relevância sustentada, geração após geração, foi adotada como princípio da Bioética. Se não podemos fazer o bem, que não façamos o mal. Um passo firme do início da Medicina. Misto de humildade e realismo, fé no humanismo. “Não inventemos sem fundamentação”, “Nada de apenas uma boa ideia” deve ter pensado Hipócrates (470ac-371ac). Evidências! Eis a questão. Herança para o pioneirismo do canadense David Sackett (nascido em 1934) acerca da Medicina baseada em evidências de nossos tempos.

Vinte e cinco séculos se passaram desde a sabedoria do Pai da Medicina. O cenário mudou. Bons fundamentos e boas ideias acumulam-se. O PubMed tende ao infinito. A  Tecnociência impensável poucas décadas está à mão. É inegável o bem que o médico atual pode fazer. E é muito!

Acontece que o Homo sapiens tem uma complexa natureza biológica. Quer fisiologia, quer fisiopatologia, é grande a chance de contraponto a métodos beneficentes diagnósticos, terapêuticos e preventivos. Não há isenção da adversidade. Ensejos de um novo mal com mais ou menos incômodo do que o que se pretende eliminar. A estruturação molecular decretou a inexistência de iatrogenia-zero. Sabe-se o quanto a constituição hídrica do corpo faz gangorras perante certas doenças. Mais líquido rebaixa a função pulmonar, menos líquido faz subir a creatinina. Por isso, o diurético é do bem… e do mal.  Negligência não prescrevê-lo, imprudência não ajustá-lo. Assim caminha a arte integrativa entre o diagnóstico da doença, a terapêutica do doente e a prevenção da adversidade.

Cada método inovador na Medicina nasce com um conjunto de adversidades possíveis. Entusiasmo e moderação sobre o último artigo publicado. Velhas maleficências recombinadas. Inevitável!  É missão do médico movimentar-se fisica e mentalmente para minimizá-las. O compromisso de comprometer-se com o caso a serviço da evitação dos chamados efeitos colaterais.

Claro, haverá sucesso na medida do possível. A medida ética resulta da mensuração da individualidade do paciente. Identificar comorbidades presentes de influência no prognóstico do bem a ser aplicado e presumir ocorrências após a aplicação. Há um lema: Preservar órgãos sadios, não agravar a condição das comorbidades. O olhar na integridade. Assumir que fará ajustes uma vez identificados prós e contras. Fiel ao propósito de adaptar o benefício conceitual às circunstâncias do meomento. Fazer o eficiente para as realidades do paciente. Raciocínios de seleção em meio a evidências da ciência e do paciente. O que se espera do médico ético. Temperança do profissional, resiliência do paciente.

Os leigos aprenderam. Sabem que a ingestão de comprimidos pode determinar gastrite. É conhecimento universal!  Um tratamento cirúrgico pode ocasionar intercorrências inevitáveis. Impossível o médico ser profeta! A síndrome de Stevens-Johnson, a aplasia medular e o edema de glote acontecem. Terrores imprevisíveis!

Fica óbvio! Não cabe falar em Não Maleficência. É muito incisivo em tempos de pluralidade de métodos beneficentes. Soa paralisante. Mas há que se manter o espírito hipocrático da  prudência.  A palavra substituta para os dias atuais é Segurança.

Segurança indica o valor da caução de regular o potencial do mal (para o paciente) na conveniência do bem (para a doença). Risco de método invasivo proibitivo? O conveniente é a menor invasibilidade que possa trazer um benefício. Facilita o médico vivaz  em face da pluralidade cotidiana das circunstâncias!

Em suma, a mais adequada relação risco-benefício –aval da segurança- começa  por só considerar aplicável o que de fato é  validado útil e eficaz  para a necessidade do paciente. Não ao supérfluo e ao fútil! Prossegue com a realização dos ajustes, acréscimos ou reduções ao estado da arte, ditados pela focalização naquela pessoa-paciente. Complementa-se pelo  respeito máximo às habilidades no uso autorizado dos métodos diagnósticos, terapêuticos e de prevenção.

A Bioética da beira do leito adota  a Segurança como fator essencial do equilíbrio entre a imprevisibilidade da  Medicina de nossos tempos e a vulnerabilidade tradicional do paciente corpo e mente.

Por fim, lembremos o chinês Confúcio (551ac-479ac): “O homem precavido quando se sente em segurança não deve ficar desatento aos perigos”.

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