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273- Não esqueçam da Bioética para o novo Código de Ética Médica

1867Há uma revisão do Código de Ética Médica em curso coordenada por uma Comissão Nacional de Revisão do Código ligada ao Conselho Federal de Medicina e que estimula a colaboração de associações médicas, sociedades de especialidades, entidades de ensino médico, etc…, bem como todos os médicos registrados nos Conselhos Regionais de Medicina.

Já se passaram cerca de 90 anos desde a instituição do Código de Moral Médica, efetivamente o primeiro brasileiro, versão em português do aprovado no VI Congresso Médico Latino Americano. Na verdade, circulou de 1867 a 1929 uma tradução do Código de Ética Médica da American Medical Association, contudo pouco aplicável à realidade brasileira da época. Por curiosidade, um dos textos causaria arrepios hoje em dia: “… À imbecilidade e aos caprichos do paciente deve conceder-se uma desculpa razoavel…” .

Um novo Código da profissão médica impõe-se pela ideia de prazo quinquenal de validade em face da acelerada transformação da Medicina enquanto ciência, de tudo a que o ser humano precisa ir se adaptando – e cada vez mais rápido – e dos movimentos “quânticos” das premissas para que ele vá acertando a gestão da própria vida. Dada a ampliação das fontes de contribuição, pode-se prever uma sugestão privilegiando a disposição de caráter do médico, outra o tipo de ação, mais uma as consequências da atuação. Por isso, creio ser  interessante repercutir sobre o significado de um Código de Ética Médica.

Uma versão atualizada de Código de Ética é sempre um novo começo. Filtra-se o passado, acresce o presente e assim garante-se uma eticidade razoável para o futuro. A coleção de princípios fundamentais, direitos dos médicos e artigos balizadores do ser médico deve representar mais uma soma de padrões vigentes de reivindicações de moralidade para a consciência,  agregação de uma miscelânea propositiva de forma coerente e apresentação de caminhos  e menos o intuito de legislar. Há o objetivo de uma “colocação no papel” do que já passa pela mente, moralmente valorizado e validado, enfim, uma formulação mais para uma aceitação de autenticidade do momento profissional do que para uma determinação autoritária. Por isso, como já comentei em outras oportunidades, respeito, mas não aprecio, o caput É vedado ao médico.

Já se disse que um código de atuação profissional deve se aplicar (a) a colegas, (b) a todos os colegas, (c) apenas a colegas e, evidentemente, (d) referir-se à Ética. Este último item remete para apreciações sobre caráter e comportamento.

Assim sendo, sugestões a serem dadas devem ser fundamentadas num padrão de conduta moralmente aceitável – e sem empecilhos legais-  para orientar membros de um grupo- médicos-, basicamente porque eles fazem parte do grupo. Deve ser respeitada uma conexão entre a moralidade vigente na sociedade brasileira, a moralidade  do agente moral – o médico- e a medida pretendida para ser seguida. Ou seja, sob uma plataforma de moralidade admissível, deve haver clareza sobre o que seria profissionalmente correto ou equivocado numa redação de artigo direcionada para o bem/não mal, alinhada com a presunção do bom caráter e com a visão do respeito humano.

É essencial que não se perca o foco na profissão, na atividade que traz utilidade. Ideal de ser de uma pessoa é uma coisa, ideal de ser médico é outra, embora possam admitir  superposições. As combinações de caráter, personalidade e de temperamento dos médicos são tão infinitas quanto da Humanidade em geral e pouco influenciam a seleção e/ou a manutenção do responsável pelo atendimento por parte do paciente. A regulação a ser mentalizada por quem fizer sugestões para o novo Código de Ética é sobre a linha de conduta profissional. Um  imaginário médico pela manhã e jornalista à tarde, portando suas características bandeiras morais começaria o dia ocupando-se em preservar o sigilo de acordo com o interesse do paciente e terminaria ocupando-se em revelar o sigilo de um noticiado em nome do interesse da sociedade. Nenhum drama de consciência ele teria, pois se comportou em cada período segundo a profissão em exercício, “jurada” seguir, sem nenhuma violência a sua moralidade. Desta maneira, conhecimento e capacitação para a ocupação seguem um juízo profissional para cujo exercício faz-se necessário um fio condutor, vale dizer um Código de Ética da profissão. Na verdade, um fio condutor não de uma pessoa, mas do coletivo do ofício.

Jovens formandos juntam-se por adesão à profissão, tendo o número do CRM como elo profissional. Um dia médico e barbeiro estiveram em “mesma profissão”, hoje, especialistas, superespecialistas, assistencialistas e pesquisadores são todos profissionais iguais – médicos – que se declaram separadamente como tais, não somente absorvendo as vantagens da imagem da atividade, como também exercendo bem distintas aproximações com circunstâncias do ser humano de interesse da Medicina – pré-natal, nascimento, crescimento, sofrimento, terminalidade, morte e pós-morte. A pluralidade ocupacional está exposta a certos temas polêmicos, que com legalidade assegurada, são exigentes de posicionamentos morais- engenharia genética, aborto terapêutico, ortotanásia, por exemplo. Para qualquer eventualidade, tranquila ou preocupante, há uma mesma coleção  sistematizada de regras- Código de Ética Médica-, exigindo um coletivo de capítulos e uma profusão de artigos para satisfazer às eticidades necessárias. Interpretações são demandadas e neste mister soa útil um Alô Bioética!

Neste contexto, a Bioética funciona como um repositório de pensamentos estimulados pelo cotidiano mal resolvido, pelas inovações mal conhecidas e pelos infinitos ineditismos renovadores da Humanidade. Todos os dias um Comité de Bioética se vê diante de confrontos na beira do leito, de métodos que pretendidos por pacientes desesperados apresentam grandes incógnitas sobre benefício/malefício e de ideias fantásticas que pipocam do planeta.

Há um certo quê de clandestinidade nos ambientes da Bioética nas discussões sobre o incompreensível, o inexplicável e especialmente sobre o obscuro. Ele não é transgressor exatamente, mas como ultrapassa intelectualmente as fronteiras estabelecidas da Ética e do Direito, vale dizer, as precedências de apreciação moral e ética,  formam-se suficientes barreiras para que o médico em geral  veja a Bioética apartada do seu mundo real. Por outro lado, a interdisciplinaridade, transdisciplinaridade mesmo dos profissionais da saúde sem fronteiras militantes na Bioética é caixa de ferramentas bastante para amadurecer temas que um dia serão de alto interesse da sociedade, motivo de apreciação inovadora ou revisora pelo Direito e – muito importante- manancial da periodicidade de sugestões para cada novo Código de Ética Médica.

Por isso, a Bioética deve ser um dos etc… do primeiro parágrafo deste artigo. O Centro de Bioética do CREMESP é um dos espaços habilitados a ter a honra!

 

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